Lapidando a palavra

Sentadas lado a lado, as alunas retiram os marca-textos do estojo. Escolhem os de cor amarela. Começam a ler um parágrafo sobre a Lua, marcando os erros de ortografia que conseguem identificar: o “t” que deveria ser maiúsculo em “planeta terra”, o acento agudo que faltou em “agua”, o ponto final ausente entre uma frase e outra. Há outros problemas no texto, como duas frases que se contradizem ou a repetição do sujeito “A Lua” em todas as orações, mas por ora a dupla se detém apenas no que a gramática determina ser errado. As revisões de conteúdo e estilo virão depois, com marcatextos de outras cores.

O método faz parte da sequência didática que o Sabin tem adotado, desde 2016, para a produção de textos dos alunos de 4º e 5º anos do Ensino Fundamental, que tem gerado avanços significativos na qualidade do que eles estão escrevendo, com reflexo nas séries seguintes. Em resumo, essa abordagem reforça nos alunos o hábito de revisar os próprios textos e oferece uma metodologia objetiva e sistemática para isso, além de tomar como central o conceito de que um bom texto não nasce pronto; é fruto de várias versões. “Revisar e corrigir sucessivas vezes um mesmo texto, aprimorando-o constantemente, é mais produtivo do que produzir muitos textos e revisá-los uma vez só cada um”, diz a assessora de Língua Portuguesa Karla Ramos.

Nessa proposta de trabalho, um único parágrafo de poucas linhas ocupa uma classe por algumas aulas. O que importa, explica Karla, é a qualidade da reflexão e do trabalho com o texto, não a velocidade.

O processo todo começa com um tema. No primeiro trimestre deste ano, para as turmas do 5º ano, por exemplo, o tema foi a Lua. Como mote inicial, a professora pergunta à classe: “O que vocês sabem sobre a Lua?”.

À medida que a classe responde, a professora registra na lousa termos-chave que vão sendo citados: satélite, Terra, Sistema Solar, luz própria, crateras, gravidade. A tarefa seguinte consiste em cada aluno escrever um pequeno texto com os termos registrados. Em seguida, a professora seleciona um dos textos para trabalhar coletivamente. Sem revelar a autoria – o objetivo não é expor ninguém –, ela o projeta na lousa para que todos vejam e distribui cópias impressas. “Esse texto está bom? Será que podemos melhorá-lo? Como?”.

É aí que entram os marcadores. Utilizando um sistema de cores para identificar os problemas do texto por critérios estabelecidos em uma grade de correção (ver quadro), os alunos começam a revisar o que deve ser corrigido ou aprimorado. É uma etapa que demanda tempo. “Na aula passada, vimos que, mesmo com as correções de ortografia, pontuação, letra maiúscula e acentuação, o texto ainda tinha problemas”, diz a professora. “Observamos que devemos nos preocupar também com palavras adequadas ou inadequadas, repetições, redundâncias”.

E assim eles avançam, orientados pela professora. Segundo Karla Ramos, uma grande vantagem desse trabalho é deixar claro tudo o que faz um bom texto. “Para os alunos, é importante a percepção de que, quando a professora corrige o seu texto, ela o faz objetivamente. Eles passam a entender o cerne dos seus problemas: o que é pedido, o que entregam e como podem melhorar”, diz a assessora. “Para a professora, isso ajuda a identificar as facilidades e dificuldades de cada aluno”.

Finalizada essa primeira etapa, a sequência didática ainda termina com a produção de um novo texto individual, dessa vez após leitura e pesquisa mais aprofundadas sobre o tema. A evolução já se nota aqui e permanece mais adiante. “Estamos no segundo ano dessa metodologia e já podemos afirmar que a qualidade da produção de textos dos alunos de 6º ano tem se mostrado superior”, diz Dionéia Menin, coordenadora pedagógica do Ensino Fundamental I.

Para Dionéia, essa proposta de atuação serviu, ainda, para dar mais consistência ao trabalho das professoras regentes. “A implantação dessa nova dinâmica tem sido orientada pela Denise Masson, nossa assessora de Língua Portuguesa para o Fundamental II e Médio, que tem conhecimento especializado na didática da Língua Portuguesa e pôde contribuir muito com a nossa equipe”, diz. Doutora em Semiótica e Linguística Geral pela USP, Denise realiza encontros mensais de formação com as professoras do Fundamental I desde 2015, com foco específico em produção de textos.

“O interessante é que, no geral, os alunos demonstravam conhecer as regras. Nas avaliações, eles iam bem”, diz Dionéia. “Mas, ao produzir textos, nem sempre eles transpunham os conhecimentos linguísticos para a escrita”. Daí por que a nova proposta do ciclo intensifica o exercício das habilidades envolvidas na produção textual, incluída aí a prática da revisão do próprio texto.

“Outra mudança que temos adotado nesse sentido, para todas as séries desde o 2º ano do Fundamental, é que passamos a incentivar os alunos a responder às avaliações com orações completas, recuperando o conteúdo das questões”, diz a coordenadora. Se a questão pede para identificar os personagens de uma fábula, por exemplo, os alunos do 2º ano são orientados a escrever “Os personagens da fábula são a lebre e a tartaruga”, e não apenas “lebre” e “tartaruga”. Uma mudança sutil, mas importante para ensinar os alunos a sempre pensar o que registram no papel não como palavras soltas, mas como unidades de sentido.

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